O mercado de capitais brasileiro encerrou o primeiro semestre de 2025 com um volume financeiro de R$ 7,94 trilhões, registrando crescimento de 6,8% em relação ao segundo semestre de 2024. O dado reflete uma mudança estrutural no perfil dos investimentos, com destaque para o avanço dos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs), que vêm se consolidando como alternativa ao crédito bancário tradicional.
Segundo Volnei Eyng, CEO da gestora Multiplike, o momento atual representa uma “janela rara” de expansão. “Estamos diante de uma oportunidade que não se repetirá. O mercado está se sofisticando rapidamente, e quem tiver estrutura e capacidade de adaptação sairá na frente”, afirma.
Os FIDCs registraram entrada líquida de R$ 2,7 bilhões entre janeiro e julho de 2025, acumulando um volume total de R$ 49,3 bilhões. A renda fixa continua dominante, representando cerca de 60% do total investido — o equivalente a R$ 4,7 trilhões — mas os fundos estruturados vêm ganhando espaço entre investidores que buscam diversificação e maior retorno ajustado ao risco.
No caso da Multiplike, que atua em setores como construção civil, agronegócio e indústria, a empresa já cedeu mais de R$ 50 bilhões em créditos nos últimos anos e projeta R$ 17,5 bilhões em crédito estruturado até o fim de 2025.
Crédito privado como motor de transformação: A expansão dos FIDCs é comparada por Eyng ao movimento observado nos Estados Unidos após a crise de 2008, quando empresas de crédito estruturado cresceram rapidamente em um ambiente regulatório favorável. No Brasil, o amadurecimento do mercado de capitais e a busca por alternativas ao sistema bancário tradicional estão criando um novo cenário competitivo.
“O crédito está se tornando uma commodity. Quem souber se posicionar agora criará barreiras de entrada e garantirá vantagem estratégica nos próximos anos”, avalia o executivo.
E para saber mais sobre o momento do FIDCS no Brasil, a GZM conversou com Volnei Eyng, CEO da gestora Multiplike. Confira:
GZM: Quais setores estão mais receptivos ao crédito estruturado via FIDCs neste momento?
Volnei Eyng: Hoje já não falamos de um nicho restrito. Os FIDCs amadureceram a ponto de serem uma solução presente em praticamente todos os setores da economia, justamente por oferecerem crédito estruturado com competitividade e eficiência.
Ainda assim, identificamos maior concentração em três frentes: indústria de transformação, que historicamente lidera a demanda; agronegócio, que vem ampliando o uso de estruturas para capital de giro e expansão; e construção civil, setor que começa a adotar os FIDCs de forma mais consistente à medida que percebe a flexibilidade e as vantagens desse modelo em relação ao crédito tradicional.
GZM: Como a Multiplike avalia os riscos regulatórios e de inadimplência nesse novo ciclo de crescimento?
Volnei Eyng: Todo ciclo de crescimento traz consigo a necessidade de maior solidez regulatória e monitoramento de risco. A boa notícia é que a indústria evoluiu nesse sentido: hoje temos estruturas mais transparentes, lastro mais robusto e mecanismos de controle que reforçam a segurança das operações.
É claro que o ambiente de juros altos pressiona a inadimplência, mas quando olhamos para as carteiras de direitos creditórios dos FIDCs, observamos um cenário cada vez mais saudável. Isso se deve à expertise na originação de crédito.
Fazemos um acompanhamento contínuo da inadimplência dentro dos FIDCs M.M em nosso Índice Multiplike de Devedores, construído a partir de dados da Anbima e que serve como termômetro confiável de risco no setor.
GZM: Que tipo de inovação é necessária para manter a competitividade dos fundos estruturados diante da comoditização do crédito?
Volnei Eyng: A verdadeira inovação não está apenas no produto, mas na experiência. Empresas não buscam simplesmente crédito, mas sim estruturas que se moldem ao seu crescimento.
Isso significa agilidade na liberação de recursos, flexibilidade em garantias e prazos, acompanhamento próximo e inteligência para transformar o crédito em vantagem competitiva.
O diferencial, portanto, não é oferecer mais do mesmo, mas entregar soluções customizadas que façam sentido estratégico para o negócio do cliente.
GZM: Há espaço para investidores pessoa física nesse mercado ou ele continuará restrito à institucionais?
Volnei Eyng: Há sim, e cada vez mais. A regulamentação trazida pela Resolução CVM 175 abriu espaço para ampliar o acesso de investidores pessoa física aos FIDCs, que antes eram mais concentrados em institucionais.
Isso representa um avanço importante, porque democratiza o acesso a um ativo que combina retorno atrativo com risco mitigado, já que é lastreado em recebíveis diversificados. Estamos assistindo ao início de uma nova etapa de expansão desse mercado, que pode se consolidar como alternativa real dentro da carteira de investidores.
GZM: Como a empresa está se preparando para um eventual cenário de saturação ou retração no mercado de capitais?
Volnei Eyng: Para nós, o crédito estruturado só faz sentido se for um instrumento estratégico para o cliente. É assim que nos preparamos para qualquer ciclo, seja de expansão ou retração. O Banco Central, ao autorizar a SCFI (Sociedade de Crédito entre Instituições Financeiras) dentro do conglomerado econômico da Multiplike, abriu novas frentes de atuação que ampliarão o leque de soluções.
Isso nos permite diversificar, estruturar operações mais competitivas e responder rapidamente a mudanças de cenário. Mais do que prover recursos, o objetivo é entregar inteligência financeira e alternativas sólidas que sustentem o crescimento das empresas mesmo em períodos de maior restrição no mercado.
