Minas Gerais vive uma das maiores crises ambientais de sua história recente. Com mais de 10 milhões de hectares queimados ao longo dos últimos 40 anos — o equivalente a 17% do território estadual — o estado se tornou um dos epicentros das queimadas ilegais no Brasil. Somente entre janeiro e setembro de 2025, o Corpo de Bombeiros Militar de Minas registrou 18.972 focos de incêndio em áreas de vegetação, com uma média de 150 ocorrências diárias em setembro.
O impacto direto sobre o agronegócio é alarmante. Segundo estimativas da Emater-MG, os prejuízos provocados por incêndios no campo ultrapassaram R$ 1,2 bilhão apenas entre agosto e setembro do ano passado. As áreas mais afetadas se concentram nos biomas Cerrado e Mata Atlântica, especialmente em regiões de agropecuária e formações savânicas, onde o fogo se alastra com maior facilidade.
Fogo no campo: prejuízos e riscos para o agronegócio
Minas Gerais possui a maior área plantada de florestas do país, com mais de 2,3 milhões de hectares, além de uma ampla variedade de cultivos agrícolas e pastagens. O avanço das queimadas compromete diretamente a produção rural, a qualidade do solo, a segurança hídrica e a biodiversidade — pilares essenciais para a sustentabilidade do agronegócio.
O biólogo André Luiz Zaidan, professor da Afya Contagem, alerta para os efeitos ecológicos sobre os biomas. “A Mata Atlântica, por ser um bioma úmido e não adaptado ao fogo, sofre impactos severos. As queimadas causam alta mortalidade de flora e fauna, dificultam a regeneração natural e empobrecem a floresta. Com isso, há perda de funções ecológicas essenciais, como o sequestro de carbono e a regulação do ciclo da água.”
No Cerrado, apesar da adaptação natural ao fogo, o aumento da frequência e intensidade das queimadas — geralmente causadas por ação humana — rompe o equilíbrio ecológico. “Isso leva à perda de biodiversidade, à degradação do solo e favorece a invasão de espécies exóticas”, explica Zaidan.
Mobilização do setor agropecuário
Diante da gravidade do cenário, o Governo de Minas Gerais e o Corpo de Bombeiros assinaram um Protocolo de Intenções com representantes do agronegócio mineiro. O objetivo é ampliar e fortalecer as ações de prevenção a incêndios no meio rural, com foco em educação ambiental, reflorestamento e monitoramento em épocas críticas.
As estratégias incluem:
- Restauração ativa e manejo adaptativo
- Controle da erosão e cercamento de áreas vulneráveis
- Uso de barreiras vivas para regeneração natural
- Reintrodução de espécies nativas
- Combate a espécies invasoras
- Engajamento das comunidades locais
Legislação e punições para queimadas ilegais
O advogado ambiental Deilton Ribeiro Brasil, da Afya Sete Lagoas, explica que quem realiza queimadas ilegais pode ser responsabilizado nas esferas penal, administrativa e civil.
- Penal: Reclusão de 2 a 4 anos e multa (Lei nº 9.605/1998)
- Administrativa: Multas de R$ 10 mil por hectare em vegetação nativa e R$ 5 mil em florestas plantadas (Decreto nº 6.514/2008, atualizado pelo Decreto nº 12.189/2024)
- Civil: Obrigação de reparar integralmente os danos, independentemente de culpa (Lei nº 6.938/1981)
Apesar do arcabouço legal robusto, o sistema enfrenta dificuldades para punir efetivamente os responsáveis. “Entre os principais obstáculos estão a insuficiência de fiscais, a carência de estrutura nos órgãos ambientais, a complexidade para identificar os autores diretos dos incêndios e a lentidão dos processos administrativos e judiciais”, afirma o advogado.
Reflorestamento urbano e impactos sociais
O impacto das queimadas também se estende às áreas urbanas. Em Belo Horizonte, o Parque Municipal Ursulina de Andrade Mello perdeu 60% de sua cobertura vegetal em apenas dois grandes incêndios nos últimos cinco anos. A prefeitura iniciou um processo de reflorestamento da área, com apoio de ONGs e voluntários.