Há um novo tipo de metro quadrado em ascensão no Brasil. Um que não se exibe em vitrines, não aparece em anúncios de luxo e tampouco tem vista exclusiva. Ele é discreto, funcional e, ao mesmo tempo, cada vez mais valioso. Trata-se do metro quadrado invisível, o dos galpões de self storage, um setor que cresce de forma acelerada e ganha protagonismo no ecossistema imobiliário nacional.
Por muito tempo, o mercado imobiliário viveu da lógica da visibilidade. O valor estava na fachada, na esquina nobre, na localização central. Mas a pandemia mudou o Brasil e, com ele, a relação das pessoas e das empresas com o espaço. O self storage floresce justamente dessa transformação. Em grandes cidades onde o metro quadrado é artigo de luxo, a capacidade de guardar, armazenar e organizar tornou-se uma nova forma de posse. Em mais de quatro décadas de atuação no setor, vi modas imobiliárias irem e virem, mas raramente um segmento uniu com tanta clareza praticidade, rentabilidade e mudança de comportamento.
Segundo a Associação Brasileira de Self Storage (ASBRASS), o número de boxes de autoarmazenagem no país cresceu cerca de 22% em 2023, enquanto o número de empresas aumentou 16% no mesmo período. Hoje, já são mais de 590 unidades espalhadas por 108 cidades, somando mais de 219 mil boxes disponíveis. A região Sudeste concentra 56% das operações e São Paulo, sozinha, abriga 40% delas. O mercado movimentou cerca de US$ 1,75 bilhão em 2024 e deve alcançar US$ 2,54 bilhões até 2030, segundo a Grand View Research.
O que explica esse avanço? Em parte, uma mudança cultural profunda. Vivemos em uma sociedade cada vez mais móvel, onde o espaço físico é um bem escasso e a praticidade se sobrepõe à propriedade. Apartamentos menores, escritórios compartilhados e o avanço do e-commerce criaram uma demanda inédita por espaços flexíveis, seguros e acessíveis. O self storage responde a essa necessidade com eficiência, oferecendo metros quadrados sob demanda, sem a burocracia e o custo fixo de um imóvel tradicional. É, em outras palavras, o streaming do espaço físico e você paga apenas pelo que usa e quando precisa.
Do ponto de vista do investidor, o modelo é igualmente fascinante. Com baixa inadimplência, custos operacionais reduzidos e alta liquidez, o setor reúne características raras no universo imobiliário. Em conversas recentes com investidores e family offices, percebo um interesse crescente em incluir o self storage nas carteiras, não apenas como ativo alternativo, mas como aposta em comportamento. Para as novas gerações, “ter” importa menos do que “acessar” e investir em negócios que compreendem essa mentalidade é apostar no futuro.
Outro aspecto que chama atenção é a tecnologia. As principais redes já operam com controle digital, locação online e monitoramento inteligente, criando um serviço que se aproxima mais de uma plataforma logística do que de um armazém convencional. É um negócio que combina concreto e nuvem, algo impensável há alguns anos e que cresce navegando entre o imobiliário, o varejo e a tecnologia.O self storage é, portanto, mais do que um segmento de nicho: é um espelho do nosso tempo. Reflete a forma como lidamos com o excesso, o ritmo e o espaço. Representa a transição de uma economia da posse para uma economia da funcionalidade. E talvez por isso, sua força esteja justamente na discrição de ocupar o vazio que a cidade já não comporta.