Na última semana, diversos estados brasileiros enfrentaram um apagão que afetou o fornecimento de energia em parte do Sistema Interligado Nacional (SIN). Para o usuário comum, parece simples: aplicativos travam, jogos param, pagamentos não passam.
Mas por trás dessa aparente simplicidade existe um problema muito mais complexo. Nossa infraestrutura energética e digital se tornou uma cadeia interdependente, onde falhas em um único ponto podem gerar efeito em cascata, impactando desde serviços essenciais até operações de grandes empresas e sistemas críticos de comunicação.
Por que isso acontece?
Concentramos muita coisa no mesmo hub, que não foi projetado para a carga e complexidade atuais. Mas não é surpresa: três fatores vêm se somando há algum tempo.
Primeiro, a explosão de demanda com IA, streaming, autenticação e inferência em tempo real pressiona redes, filas e DNS. Segundo, a concentração de dependência: muitos serviços passam pelas mesmas regiões de nuvem ou pelos mesmos provedores, então, se um nó se degrada, todo mundo sente.
E terceiro, fatores externos e geopolíticos, como energia, fibras, clima extremo e regras de soberania de dados, além de legados antigos e caros de modernizar, aumentam a complexidade operacional. O resultado são pontos de estrangulamento que se manifestam justamente quando menos esperamos.
Os impactos são sentidos em diferentes níveis. Para o usuário, apps, jogos e pagamentos ficam intermitentes; mesmo depois da correção, há aquele vai e vem enquanto as filas se esvaziam.
Para as empresas, atendimento para, vendas caem, SLAs estouram e a reputação sofre. No nível sistêmico, quando falham nuvem, ISP/CDN e meios de pagamento, o efeito pode ser nacional e até global. E há o custo invisível: equipes presas em um “apagão operativo” deixam de construir produto e decisões são adiadas por falta de dados confiáveis.
Como se preparar para um apagão?
Para consumidores: tenha sempre um plano B de comunicação (outro mensageiro ou SMS), baixe mapas, ingressos e cartões offline, use autenticador que funcione sem nuvem, carregue cartão físico e algum dinheiro, e priorize gadgets que operem localmente se a internet cair.
Para empresas: se prepare para falhar! Use múltiplas regiões ou zonas de disponibilidade, DNS e roteamento redundantes, serviços que degradam em vez de apagar, distribuição de workloads e dados críticos, edge e cache para conteúdos estáticos, runbooks testados regularmente, e um roadmap de modernização priorizando gargalos críticos. A governança geopolítica é essencial para soberania e latência por país. Simular cenários é obrigatório: planejar sem testar é apenas um slide bonito.
O que esse apagão mostra é um alerta para todos: a digitalização acelerou, a IA aumenta o tráfego, e parte da infraestrutura ainda é antiga e cara de modernizar. Falhas vão acontecer, mas podemos reduzir seus efeitos e tempo de interrupção. Para os usuários, alternativas offline ajudam a manter a rotina; para as empresas, construir resiliência desde o início garante que os sistemas continuem funcionando mesmo sob pressão.
A infraestrutura digital precisa ser tratada como um organismo vivo: ela pode falhar, se recuperar e seguir operando. Preparar pessoas, processos e tecnologia é a melhor forma de transformar um apagão em aprendizado, e não em desastre.