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Corredor ecológico corinthiano: “Mude o sistema não o clima”

Por Maria da Penha Vasconcellos, professora da Faculdade de Saúde Públida da USP e do Centro de Síntese USP Cidades Globais do Instituto de Estudos Avançados da USP, e outros autores*

Em meio ao concreto da Neo Química Arena, em Itaquera, o grito do Corredor Ecológico Corinthiano (CEC) ressoa como um hino de resistência na Zona Leste de São Paulo.
O CEC é uma articulação popular que une torcedores do Corinthians, coletivos ambientais, movimentos sociais, sindicatos e pesquisadores em torno de um objetivo comum: enfrentar as mudanças climáticas a partir da arborização e da regeneração do solo urbano.

Para compreender melhor a iniciativa, em 21 de agosto, o grupo de pesquisa do Centro de Síntese USP Cidades Globais (IEA) promoveu uma conversa virtual com representantes das entidades que deram origem ao CEC. A iniciativa nasceu da percepção da aridez e do excesso de concreto no entorno da Arena Corinthians, região marcada pela presença de ilhas de calor.

Para moradores, torcedores e ativistas ambientais, o plantio de árvores nativas seria não apenas uma medida prática de enfrentamento à crise climática, mas também uma forma simbólica de reaproximar o clube à sua tradição popular. Isto porque a iniciativa dialoga com a história do clube que foi fundado em 1910 por operários do bairro do Bom Retiro e desde então associado às lutas sociais e à resistência contra o elitismo. Nesse sentido, arborizar o território é também uma forma de resgatar a identidade coletiva da torcida e conectar a cultura popular à luta socioambiental.

Mais de 30 entidades e coletivos estão envolvidos no projeto, incluindo a Coalizão pelo Clima, a Gaviões da Fiel, o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, a Central Única dos Trabalhadores, associações de moradores e o Cades de Itaquera e Penha. Também participam coletivos culturais, organizações socioambientais e representantes indígenas, como o grupo Jaraguá. Essa diversidade reforça o caráter inclusivo da proposta, que reúne diferentes saberes e experiências em torno da regeneração urbana.

Para Beni, morador do bairro de Artur Alvim, membro do Cades Penha e da frente Avançar Resoluto, “a iniciativa foi proposta como uma resposta local e global às emergências climáticas, buscando não apenas mitigar problemas como ilhas de calor e enchentes na região de Artur Alvim, mas também se conectar com a luta mais ampla contra a crise climática”.

Como bem destacou Beni, os mutirões dão corpo a essa ideia. O primeiro mutirão, realizado em 1º de junho de 2025, contou com a presença de cerca de 750 pessoas e resultou no plantio de 207 mudas. Apesar de algumas perdas naturais, as mudas estão sendo repostas. O objetivo principal é o plantio de mil árvores nativas da Mata Atlântica no entorno da Arena Corinthians.

No dia 31 de agosto de 2025, outro plantio foi realizado, simbolicamente dedicado aos 115 anos do Corinthians, com a meta de adicionar 115 novas árvores ao corredor ecológico. Outros mutirões já estão marcados para os próximos meses, com acompanhamento técnico de engenheiros florestais e subprefeituras. Mas o CEC vai além da arborização. A proposta inclui a criação de uma “anelfloresta”, um cinturão verde inspirado nos princípios da agrofloresta urbana. A ideia é regenerar o solo e, ao mesmo tempo, integrar a comunidade em práticas de segurança alimentar.

Nem tudo é fácil. A relação com a Prefeitura de São Paulo é descrita como tensa: embora tenha apoiado o primeiro mutirão com doações de mudas, adubo e caminhão-pipa, participantes criticam o que consideram uma tentativa de apropriação política do projeto. A comunidade envolvida reforça que o caráter do CEC é autônomo e popular, nascido da sociedade civil. Já com o clube Corinthians, a articulação ainda está em fase inicial. A diretoria demonstrou interesse e conhecimento sobre o projeto, e há expectativa de que futuras parcerias possam ser construídas dentro da Agenda 2030 do clube, aproximando ainda mais o esporte das pautas ambientais.

Outro desafio é a mobilização contínua da comunidade local. Se por um lado comerciantes, professores e torcedores já abraçaram a iniciativa, ainda é necessário engajar mais moradores para que eles mesmos se tornem guardiões do território verde.

A iniciativa despertou interesse entre pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), em especial do Centro de Síntese USP Cidades Globais do IEA-USP. Para os acadêmicos, o projeto funciona como um laboratório vivo de sustentabilidade urbana e cidadania.

Os pesquisadores do Centro de Síntese USP Cidades Globais parabenizam a iniciativa pela sua complexidade, profundidade e caráter inovador. Mais do que plantar árvores, o Corredor Ecológico Corinthiano pretende criar um novo modo de relação com a cidade: uma floresta coletiva, capaz de reduzir os efeitos da crise climática, valorizar a cultura periférica e promover a participação popular.

O próximo passo é ampliar a rede de voluntários e outras torcidas organizadas e consolidar as parcerias institucionais, garantindo que o projeto siga vivo e autônomo. Para os organizadores, o CEC é apenas o início de uma transformação maior: a construção de cidades mais verdes, inclusivas e sustentáveis.

  • Grupo de pós-doutorandos do Centro de Síntese USP Cidades Globais do IEA-USP: Adriana L. de Oliveira, Alejandro J. Dourado, Francisco L. Biazini, Gilson V. Monteiro, Grislayne G. L. da Silva, Jéssica R. da Costa, Leno J. B. Souza, Maria das Graças B. Gondim, Roberta F.P. Galvão, Sabrina de O. Anício, Thalita S. Dalbelo.

Colaboração com USP comunicação

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