O mercado de crédito brasileiro atravessa um período de forte reprecificação e seletividade. Após anos de expansão impulsionada por liquidez global e juros em queda, a combinação de custos financeiros mais altos, retração dos bancos tradicionais e aumento das incertezas econômicas redesenhou o cenário de concessão de crédito no país. O agronegócio — tradicional motor de crescimento e geração de riqueza — tem sentido de forma direta os efeitos dessa transformação.
Os números confirmam o desafio. Em 2025, o Brasil registrou alta de mais de 30% nos pedidos de recuperação judicial, com destaque para o agronegócio, que acumula no último ano crescimento de 45% nos últimos anos, segundo dados da Serasa Experian. Só no segundo trimestre deste ano, o setor rural contabilizou 565 pedidos de recuperação, número recorde desde 2016. A elevação das taxas de juros e o encarecimento das linhas de crédito — algumas ultrapassando 14% ao ano no custeio — reduziram o acesso ao financiamento e pressionaram margens.
Ao mesmo tempo, mais de 6 milhões de empresas brasileiras já apresentam algum tipo de restrição cadastral, reflexo de um ambiente econômico ainda instável e de uma inadimplência que persiste em patamares elevados. No crédito rural, a taxa de inadimplência alcançou 7,9% no primeiro trimestre de 2025, evidenciando a necessidade de gestão ativa e maior rigor na concessão.
Nesse cenário, o apetite do mercado bancário tradicional diminuiu, concentrando crédito apenas em clientes com condição financeira mais robusta e maior nível de garantias ofertadas. As instituições financeiras se tornaram mais conservadoras, enquanto pequenas e médias empresas — e até produtores de médio porte — enfrentam dificuldades crescentes para acessar linhas competitivas.
É nesse espaço que gestoras especializadas em crédito estruturado, como a Multiplica, ganham relevância. Nosso modelo é pautado na combinação entre análise técnica, proximidade comercial e monitoramento contínuo de risco. A integração entre as áreas de originação e crédito permite avaliar, de forma mais precisa, a capacidade de pagamento e a sustentabilidade financeira de cada operação. O foco não é apenas liberar crédito, mas conceder crédito com propósito, lastro e visão de longo prazo.
A Multiplica encerrou o terceiro trimestre de 2025 com quase R$ 6 bilhões em FIDCs sob gestão, sendo aproximadamente 50% destinados ao agronegócio, segmento que segue como o principal vetor de crescimento. Mesmo diante de um ambiente adverso, a companhia registrou expansão de 26% no portfólio, com destaque para o avanço em operações com grandes revendas e empresas de insumos. Esse movimento é sustentado por uma política de crédito rigorosa e por uma governança sólida, que permitiram reduzir o PDD de 0,9% para 0,48% ao longo do ano.
Os desafios de análise de risco e concessão de crédito se tornaram mais complexos. É preciso lidar com variáveis como o comportamento climático, a volatilidade das commodities, a concentração de receitas por cultura e o impacto do câmbio sobre exportações e custos de insumo. Some-se a isso o chamado “fator Brasil” — a imprevisibilidade política, regulatória e tributária que adiciona uma camada extra de risco às decisões financeiras.
Por outro lado, há oportunidades evidentes. A consolidação do crédito estruturado, especialmente via FIDCs e CRAs, vem permitindo a democratização do acesso ao capital. Essas estruturas transformam recebíveis em liquidez imediata, oferecem flexibilidade e reduzem o custo de captação, ao atrelar o risco à qualidade dos créditos e não ao balanço das empresas. Em um ambiente de juros altos e seletividade bancária, o crédito estruturado se tornou um dos motores mais eficientes para financiar a economia real.
Para o agronegócio, esse modelo é mais do que uma alternativa: é uma ponte entre o campo e o mercado de capitais. A Multiplica tem atuado para conectar investidores institucionais e companhias do agro em operações que combinam segurança, rentabilidade e impacto produtivo. O resultado é uma cadeia mais estável, com capital circulando de forma saudável e sustentada por critérios técnicos.
O crédito, em essência, é uma relação de confiança — e confiança se constrói com dados, disciplina e coerência. No momento em que o país vive o desafio de equilibrar crescimento e responsabilidade, o papel das gestoras especializadas é fundamental.
Acreditamos que o futuro do crédito brasileiro será guiado por três pilares: análise de risco qualificada, monitoramento contínuo e proximidade com o cliente. É esse equilíbrio que permitirá transformar volatilidade em oportunidade e incerteza em resiliência.
Porque, no fim das contas, o crédito que nasce da terra é também o que alimenta o futuro do país.