Recentemente, o CTAT (Conselho Técnico das Administrações Tributárias Municipais) publicou uma Nota Técnica com orientações às prefeituras sobre a cobrança do ITBI na integralização de imóveis ao capital social de empresas. O documento defende a uniformização das práticas fiscais e sugere maior rigor na fiscalização — movimento que pode intensificar autuações contra contribuintes e ampliar disputas judiciais sobre o tema.
A orientação parte da interpretação, já adotada por diversos municípios, de que a imunidade constitucional ao ITBI não alcança o valor dos bens que excederem o montante efetivamente destinado à integralização do capital social. Em outras palavras: apenas a parte do valor do imóvel utilizada na integralização estaria protegida contra o imposto.
A título exemplificativo: imagine um imóvel com valor venal de R$3 milhões que é integralizado em uma empresa por R$900 mil. Em situações como essa, muitos municípios vêm exigindo o ITBI sobre a diferença entre o valor venal e o valor efetivamente integralizado, aplicando a chamada “imunidade condicionada”. Agora, a Nota Técnica emitida na semana passada, orienta que todos os municípios adotem o entendimento de cobrar o referido imposto. Em caso de fiscalização posterior, se constatada fraude, caberá multa por evasão fiscal.
Outra recomendação da Nota é que os municípios apresentem uma definição clara do conceito de “receita operacional” e sua aplicação, além da adoção expressa do valor de mercado como base de cálculo do ITBI e da inclusão de penalidade específica no Código Tributário municipal para casos de declaração dolosa de valor inferior ao de mercado.
A Nota recomenda ainda que os municípios auditem e revisem os valores em até cinco anos, exigindo laudos, comprovações e abertura de processos administrativos, principalmente quando houver inconsistências ou indícios de fraude ou simulação.
Outro ponto relevante é que nos termos da Nota Técnica, argumentos como reserva de capital, destinação para ações preferenciais, uso de valor contábil do IR ou outras manobras não afastam a incidência do ITBI. O documento ressalta que o STF, na Tese 796, não aceitou nenhum desses fundamentos em favor da isenção do imposto.
O mais importante, em termos de planejamento patrimonial e sucessório, é que o texto é parcial e faz um juízo de valor ao afirmar que sociedades constituídas com a finalidade exclusiva (ou predominante) de blindagem patrimonial familiar, sem atividade empresarial real, perderão o benefício. Nesses casos, seria aplicado o ITBI integral sobre todo o patrimônio transferido, caracterizando-se o uso disfuncional da personalidade jurídica. Ou seja, há um pré-julgamento por parte dos municípios de que toda e qualquer holding patrimonial teria sido constituída apenas com o objetivo de reduzir a carga tributária.
O Conselho Técnico também se posiciona no sentido de que a imunidade vale para integralização de capital, fusão, incorporação, cisão e extinção, mas não se aplica às empresas cuja atividade principal seja imobiliária, como compra, venda, locação ou arrendamento de imóveis. Para holdings patrimoniais com receita majoritariamente imobiliária, o risco de autuação é elevado e o ITBI será cobrado, sem imunidade, com aplicação de multa por evasão.
Por fim, o Conselho orienta que todas as solicitações de imunidade sejam processadas individualmente, com ampla documentação: certidões, contrato social, laudo de avaliação, comprovante de CNAE, balancetes, DRE e demais documentos fiscais. Ressalta ainda que a omissão de informações pode gerar indeferimento e cobrança retroativa do ITBI.
Na prática, para quem atua com Planejamento Patrimonial e Sucessório, esse posicionamento já é realidade há bastante tempo. Com a Nota, houve apenas a formalização de uma uniformização de entendimento das municipalidades quanto aos critérios para deferimento da imunidade do ITBI.
Entretanto, reiteramos que, a nosso ver, há uma desvirtuação da decisão do STF. O próprio Supremo Tribunal Federal já deixou claro que a decisão que originou esse posicionamento equivocado dos municípios não abrange a diferença entre o valor atribuído ao imóvel quando integralizado no patrimônio da pessoa jurídica e o valor venal do imóvel fixado unilateralmente pelo município.
Assim, a interpretação atualmente adotada por diversos municípios e agora corroborada pelo CTAT e por parte dos tribunais estaduais vai além dos limites efetivamente estabelecidos pela Suprema Corte. É importante destacar que a Nota Técnica do CTAT tem apenas caráter orientador, sem força vinculante, o que abre margem significativa para questionamento judicial, amparado inclusive por precedentes já existentes.
Diante desse contexto, especialistas em planejamento patrimonial e sucessório reforçam a importância de avaliar com rigor a forma de integralização de imóveis em sociedades e de estruturar a documentação necessária para mitigar riscos de autuação.