Charlie Javice, fundadora da startup Frank, foi condenada nesta segunda-feira (29) a 85 meses de prisão federal por fraude. A sentença encerra um dos casos mais emblemáticos de engano corporativo dos últimos anos, envolvendo a venda de sua empresa ao JPMorgan Chase por US$ 175 milhões.
Em março, um júri federal já havia considerado Javice culpada por três acusações de fraude e uma de conspiração para cometer fraude. A promotoria havia solicitado uma pena de 144 meses, mas o juiz Alvin K. Hellerstein optou por uma sentença mais branda, após receber 114 cartas de apoio à ré — incluindo de líderes religiosos, vizinhos e até um juiz anteriormente encarcerado.
O golpe por trás da aquisição
Fundada com o propósito de facilitar o preenchimento de formulários de auxílio estudantil, a startup Frank atraiu investidores pela promessa de acesso a milhões de jovens consumidores. Quando o JPMorgan demonstrou interesse, Javice apresentou uma base de clientes inflada — e, posteriormente, forjada.
Para sustentar a mentira, ela recorreu à criação de “dados sintéticos” com a ajuda de Adam Kapelner, professor de matemática em Nova York, e à compra de nomes e e-mails reais de corretores de dados. O objetivo era enganar os testes de verificação do banco, que acabou adquirindo a empresa sem detectar a fraude durante o processo de due diligence.
“Eles compraram uma cena de crime”, afirmou o procurador Micah F. Fergenson durante a audiência.
Arrependimento e impacto pessoal
Durante o julgamento, Javice demonstrou arrependimento. “Aceito o veredito do júri e assumo total responsabilidade pelos meus atos”, escreveu em carta ao juiz. Em audiência, ela pediu desculpas aos acionistas do JPMorgan, à equipe interna do banco, aos funcionários da Frank e à sua família.
A defesa argumentou que a pena poderia comprometer os tratamentos de fertilidade que Javice realiza, e destacou seu histórico como empreendedora jovem e inovadora. A advogada Alexandra Shapiro, recém-integrada à equipe de defesa, buscou sensibilizar o tribunal com os impactos pessoais da condenação.
Repercussões para o JPMorgan
Embora o banco tenha identificado o golpe após a aquisição, sua equipe de análise falhou em detectar a fraude previamente. O JPMorgan optou por tornar o caso público e ainda mantém uma ação civil contra Javice. Procurado, o banco não comentou a sentença.
O caso levanta questões sobre os limites da diligência corporativa em aquisições de startups e sobre os riscos de confiar em métricas não auditadas em ambientes de inovação acelerada.
A condenação de Charlie Javice marca um capítulo importante na discussão sobre ética empresarial, transparência em fusões e aquisições, e responsabilidade na era das startups. Em um mercado onde dados são ativos valiosos, a integridade na sua apresentação é mais do que uma exigência legal — é um pilar da confiança corporativa.