Na noite de quinta-feira (25), as companhias aéreas Gol (GOLL54) e Azul (AZUL4) anunciaram oficialmente o encerramento das tratativas para uma eventual fusão. A decisão, que já vinha sendo especulada no mercado, foi acompanhada da rescisão do acordo de codeshare firmado em maio de 2024 — parceria que permitia a integração das malhas aéreas domésticas exclusivas das duas empresas.
O fim do codeshare, embora não obrigatório diante da desistência da fusão, sinaliza uma mudança de estratégia comercial. O acordo, que funcionava como uma espécie de compartilhamento de voos entre as companhias, permitia que rotas operadas por uma delas fossem vendidas pela outra, ampliando a conectividade e otimizando a ocupação dos voos.
Por que o codeshare foi encerrado?
Segundo especialistas, a rescisão do acordo pode estar diretamente ligada às cláusulas contratuais previamente pactuadas. “Se o contrato de codeshare tiver cláusulas de rescisão vinculadas à fusão — o que é possível em acordos estruturados com visão estratégica —, o fim das negociações pode, sim, autorizar o rompimento. Caso contrário, as companhias podem continuar a cooperar normalmente”, explica Fernando Canutto, sócio do Godke Advogados e especialista em Direito Societário.
Na avaliação do jurista, o encerramento do codeshare também pode ter sido motivado por uma mudança de cenário econômico e operacional. “O Dólar tem tido quedas, o que significa que o custo operacional está menor e os acessos às passagens está mais facilitado”, afirma Canutto, indicando que a parceria pode ter perdido relevância diante da nova conjuntura.
Fusão encerrada: há consequências jurídicas?
O término das negociações de fusão entre Gol e Azul, por si só, não gera consequências jurídicas imediatas, desde que as tratativas estivessem em fase preliminar e não vinculante. No entanto, tudo depende do estágio das negociações e da existência de documentos formais como Memorandos de Entendimento (MoUs), Term Sheets ou acordos de exclusividade.
“Se tais instrumentos tiverem cláusulas vinculantes, como obrigações de confidencialidade, no-shop ou penalidades por desistência injustificada, podem surgir obrigações jurídicas, inclusive de indenização em caso de descumprimento. Caso contrário, o encerramento é lícito e natural em negociações empresariais complexas, especialmente em setores regulados como o de aviação”, explica Canutto.
Embora o encerramento da fusão não represente, em regra, uma infração legal, há situações em que a responsabilização pode ocorrer. Isso acontece quando há evidência de má-fé, manipulação de mercado ou uso indevido de informações para influenciar o comportamento dos investidores.
Nos termos da Instrução CVM 44/2021, companhias abertas são obrigadas a divulgar fatos relevantes que possam impactar a decisão de investimento dos acionistas. O anúncio de uma negociação de fusão, mesmo que não vinculante, pode ser justificado como um ato de transparência — sobretudo em casos de vazamento de informações ou especulação excessiva.
“Entretanto, se restar demonstrado que o anúncio foi utilizado de forma artificial para inflar os preços das ações ou induzir o mercado ao erro, as companhias ou seus administradores podem ser responsabilizados administrativamente pela CVM, e até civilmente por investidores prejudicados. Essa responsabilização, contudo, exige prova de dolo ou culpa grave”, conclui Canutto.
O que esperar daqui para frente?
Com o fim da fusão e do codeshare, Gol e Azul retomam suas estratégias de forma independente. O mercado acompanha com atenção os próximos passos das companhias, especialmente em um contexto de recuperação da demanda aérea e reestruturação financeira.
A expectativa é que ambas reforcem suas malhas próprias e busquem novas parcerias comerciais, nacionais ou internacionais, para ampliar a competitividade. O encerramento do acordo, embora represente o fim de uma tentativa de consolidação, não impede futuras aproximações — desde que alinhadas às novas condições de mercado e aos interesses estratégicos de cada empresa.