A 20ª edição da LABACE (Latin American Business Aviation Conference & Exhibition) aterrissou no Campo de Marte no início de agosto com pompa e resultados expressivos. Foram mais de 14 mil visitantes, 54 aeronaves expostas e uma estimativa de US$ 150 milhões em negócios gerados, consolidando o evento como o principal ponto de encontro da aviação de negócios na América Latina.
Mas enquanto empresários, operadores e executivos circulavam entre jatos de última geração e helicópteros de cauda T, dois personagens discretos observavam o espetáculo com olhos que não podiam comprar passagem para aquele mundo. Seu Arlindo, 70 anos, faxineiro, e Wescley, 25, auxiliar de serviços gerais, limpavam fuselagens como quem tenta polir a própria esperança.
“A gente limpa avião que vale mais do que tudo que eu já ganhei na vida. Mas é trabalho, né? Tem que fazer”, diz seu Arlindo, que vive com um salário mínimo e complementa a renda vendendo lanches aos domingos.
Wescley, que sonha em ser médico veterinário, não consegue parar para estudar. “Eu queria fazer cursinho, mas não dá. Trabalho o dia todo e ainda ajudo em casa. Ver esses aviões me dá vontade de voar também, mas por enquanto é só pano e produto de limpeza.”
Aviação de negócios: motor da economia, mas acessível a poucos
Enquanto alguns sonham, outros fazem negócios e a LABACE 2025 não apenas superou as expectativas comerciais, como também reforçou o papel estratégico da aviação de negócios no Brasil.
Segundo a Associação Brasileira de Aviação Geral (ABAG), o setor registrou crescimento de 32% na movimentação aérea no primeiro semestre de 2025, com aumento expressivo na frota de jatos, turboélices e helicópteros.
Com projeção de 1 milhão de voos até o fim do ano, o Brasil se consolida como um dos maiores mercados de aviação executiva do mundo. A infraestrutura aeroportuária, centros de formação e mão de obra qualificada sustentam esse avanço. No entanto, o setor enfrenta desafios como carga tributária elevada, escassez de técnicos especializados e pressões regulatórias ambientais.
“A aviação de negócios é essencial para a conectividade e o desenvolvimento econômico no Brasil”, afirma Flavio Pires, CEO da ABAG. “Mas precisamos garantir um ambiente regulatório que estimule investimentos e preserve a competitividade.”
A distância entre o hangar e o sonho
A aviação executiva é, de fato, uma ferramenta de desenvolvimento. Ela conecta regiões remotas, facilita negócios e impulsiona setores como agronegócio, mineração e saúde. Mas também escancara as discrepâncias sociais brasileiras: enquanto aeronaves são vendidas por dezenas de milhões de dólares, trabalhadores como Arlindo e Wescley vivem com pouco. Bem pouco mesmo.
A LABACE é vitrine de inovação, digna de ser comemorada, mas parece ser também um espelho de um país de imensos contrastes, como o abismo entre quem voa e quem limpa o chão do hangar.
“A gente vê tudo isso e pensa: será que um dia muda?”, pergunta Wescley, enquanto observa um executivo embarcar em um jato particular.
Voar pode custar muito caro, mas sonhar, Brasil, não custa nada.
