No dia 9 de julho (feriado em São Paulo) fomos surpreendidos por uma carta ameaçando o Brasil com tarifas na entrada de seus produtos no mercado norte-americano. Essa é uma data importante no nosso país e talvez seja desconhecida pelo presidente dos EUA.
Ela serve para lembrar os feitos da Revolução Constitucionalista de 1932, a qual combateu o governo de Getúlio Vargas, que tinha tomado o poder dois anos antes e implantado uma ditadura no Brasil. Foram quase três meses de confrontos, com estimativas de mais mil mortos, entre os militares e voluntários paulistas e outros tantos nas tropas do governo federal.
Coincidência ou não, a carta que Donald Trump enviou ao governo Lula, no último 9 de julho, foram feitas afirmações de que houve “ataques insidiosos do Brasil contra eleições livres e à violação fundamental da liberdade de expressão dos norte-americanos”, em virtude “de ordens de censura decretas e ilegais a plataformas de mídia social dos EUA” emitidas pelo STF. Além disso, a carta menciona que o julgamento dos atos antidemocráticos, no qual o ex-presidente Jair Bolsonaro figura como réu, seria uma “caça às bruxas” e deveria ser encerrado imediatamente.
Essas acusações seriam a justificativa para a imposição de uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros. Exatos 93 anos após a Revolução Constitucionalista afastar um golpe contra nossa república, sofremos um novo golpe em nossa soberania. Porém, diferentemente daquele que custou milhares de vidas, esse custará milhares de dólares para ambas as economias. A tarifação é uma tentativa explícita de interferir nos processos internos brasileiros, sendo vista como um absurdo por diversos especialistas.
O renomado economista Paul Krugman chamou a medida de “descaradamente ilegal”, por baseada em razões políticas (o caso Bolsonaro), e denunciou o abuso de autoridade presidencial. Economista Nobel Joseph Stiglitz chamou Trump de “bully que usa tarifas como arma”, lembrando que tais medidas costumam recuar diante de respostas firmes.
Isolada a intenção política associada a medida, economicamente sua proposta é incoerente. O Brasil tem déficit comercial com os EUA. No somatório da série histórica da balança comercial, desde 1997, Brasil registra déficit comercial de US$ 48,2 bilhões. Nos últimos 16 anos, as vendas norte-americanas ao Brasil superaram suas importações em US$ 88,61 bilhões. Portanto, a tarifa de 50% não se justifica economicamente.
Economistas alertam que a decisão “estabelece um precedente assustador” ao usar tarifas como ferramenta política, e pode prejudicar os consumidores americanos via aumento de preços de produtos como café e suco de laranja. No Brasil, o impacto pode chegar a reduzir o PIB de 0,3% a 0,8% em 2025, segundo estimativas de economistas e empresas de consultoria especializadas. Dentre as diversas ofensas presentes nessa medida, a imposição da tarifa:
· Carece de base econômica, sendo abusiva para recompor um déficit comercial inexistente;
· É uma ferramenta de pressão política e sobre a soberania da república;
· Representa o aumento de preços de insumos produtivos e prejudica consumidores nos EUA;
· Cria animosidades diplomáticas entre os países e demonstra um ânimo para guerras comerciais com qualquer país que não se curve aos interesses pessoais e políticos do Governo Norte-Americano; e
· Pode gerar uma reorganização das cadeias produtivas, criando novas parcerias comerciais entre países tarifados pelos EUA.
Em 1932, o povo paulista — e com ele o Brasil — ergueu-se em defesa da Constituição, da legalidade e do direito de decidir o próprio destino. Hoje, quase um século depois, vivemos novamente um momento em que a nossa soberania é desafiada. O anúncio feito pelo presidente Donald Trump de impor tarifas de 50% sobre os produtos brasileiros é injustificável, desproporcional e, acima de tudo, contrário aos princípios do comércio justo e da convivência entre nações soberanas. Assim como em 1932, não aceitaremos imposições externas que desrespeitem nossas instituições, nossa economia ou nossos valores democráticos.